Existe muita coisa na sociedade moderna que me provoca um certo asco. Não sei bem se nasci numa época que não a minha, se faço parte de uma percentagem mínima da minha geração que se revolta contra este avanço extraordinário que incentiva a preguiça, o sexo marcado, as relações por SMS ou pelas redes sociais e a falta de carisma e personalidade. A época de casais que ambicionam tirar a melhor fotografia para o Instagram para acabarem agarrados ao Smartphone, numa competição supérflua para ver quem tem mais “Likes”. A época em que esta tendência se ergue numa distorção de valores, numa mudança meio estranha de mentalidades.
Surgiram já há uns anos sites e aplicações para encontros, conhecer pessoas online, “encontrar o amor” - dizem. A mais recente moda é a do “Tinder” e afins. Resumidamente, estas aplicações funcionam como um catálogo, em que os produtos oferecidos são pessoas com a mesma orientação sexual que estão ou estiveram pela mesma área. Decidi experimentar depois de conhecer algumas pessoas que lá estiveram, umas na brincadeira e outras porque procuravam sexo sem compromisso e umas pitas.
Inscrevi-me numa aplicação do género do Tinder. Em primeiro lugar, devo dizer que fiquei surpreendida. O catálogo era muito apelativo, contrariamente ao que esperava – tinha a ideia de que quem aderia a aplicativos do género eram pessoas com falta de autoestima e, não querendo ir por aí, com razão para tal. Então comecei a parte mais aliciante da questão - passar o catálogo, escolher os produtos.
Compreendo as pessoas mais tímidas que ficam acanhadas face-a-face e acabam por se relacionar com mais facilidade devido a esta barreira da distância. Não sei como fazem se realmente se encontrarem com a pessoa mas, conversar online, de facto é mais fácil. No que diz respeito à compreensão, ficamos por aqui.
Conversei com alguns marmanjos engatatões dos quais seleccionei dois tipos, sendo a mais comum – “Estou aqui porque gosto de conhecer pessoas” – quase ao nível de “li e concordo com os termos e condições de uso”. A maior parte procurava passar um bom bocado, logo depois de dizer que está ali para conhecer pessoas diferentes e os mais diretos, o segundo tipo, já parte de um nicho de meninos com mais confiança, ia direto ao assunto com “o que achas de amizades coloridas?”. Na maior parte das vezes pediram-me um encontro, quase todos um café (primeiro), e mais uma vez os mais diretos convidaram-me a ir “ver um filme a casa deles” ou outra deixa parecida.
Fui capaz de inventar uma pessoa completamente oposta a mim, inventar as histórias mais estúpidas, tretas sem sentido nenhum, engoli uma enciclopédia de frases feitas e cuspi-as todas e ninguém se apercebeu. Isto significa que nunca sabemos quem está do outro lado, mas esta já é velha. Depois, por trás de tanta confiança, de tanta personalidade possivelmente mal avaliada no texto (escrito muitas
vezes por “Tarzans”) quem é que garante que pessoalmente não são uns enormes panhonhas ou um taradeco qualquer? - Não cheguei a descobrir, decidi manter o meu rim.
Mais impressionante ainda é a quantidade de pessoas que estão ali à procura de “bons momentos”, tanto os que vem com a tanga abissal do conhecer pessoas, como os mais diretos. Bem, nada contra bons momentos, aprovo e subscrevo, mas qual é a graça do sexo marcado assim, sem sal? E antes disso! Onde está aquela sensação insubstituível que surge quando o interesse é mútuo, mesmo que ninguém queira ali mais do que uma boa noite, onde está o ritual do charme, onde está o risco que se corre quando se falam pela primeira vez, a medo, e a pequena euforia quando é correspondido. Onde está aquela conversa absurda, os olhares cruzados. Onde está o pensamento rebelde que nos diz “já estás!”, mesmo quando o tentamos evitar.
E chega, acredito que já me fiz entender.
Mas enfim, também me revolta a fome no mundo, o aquecimento global e a corrupção. Ou não.
Cada um faz o que quer.
Joana Cancelinha
Não fui eu
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sexta-feira, 22 de julho de 2016
segunda-feira, 11 de maio de 2015
A praxe Académica
Estou pela segunda vez no primeiro ano de faculdade, sendo que a minha primeira experiência das praxes foi tão boa, na medida em que os primeiros amigos que fiz foi assim, achei que deveria ir de novo. Na primeira vez, fizemos uns jogos, umas parvoíces, nada ofensivo, equipas, cantámos músicas que inventámos, bebemos, conheci caloiros e veteranos, e tudo decorreu dentro da normalidade. No entanto não consegui ir ao último dia - o "Tribunal de Praxes". Este ano, tentei vir às praxes da nova faculdade, mas por não morar em Lisboa, acabei por não me dar ao trabalho e, como já tinha sido caloira uma vez, já me tinha divertido neste "ritual", não liguei e desleixei-me.
Entretanto, este semestre acabei por decidir dar uma oportunidade e voltei a ir. Escolhi padrinho, fui a um jantar no qual me diverti imenso, conheci algumas pessoas da minha suposta equipa, muito simpáticas e hoje fui ao baptismo. Mas o pior vem depois.
Fui pela primeira vez ao dito cujo "Tribunal de Praxes".
Achei que era algo na "descontra", uma brincadeira (ideia com que fiquei pelo que me contaram
à cerca do ritual, no ano passado). mas rapidamente cheguei à conclusão de que não. Aquilo era levado a sério, e as pessoas iam realmente a julgamento,
Ora compreendo o conceito de julgamento no caso de um "trajado" (como lhes chamam por estas bandas) ter abusado do seu poder, tipo ofender a integridade física ou psicológica do caloiro, submete-lo a uma situação tipo "Meco", mas não. Foram a julgamento por usar uma mala com o traje e por uma brincadeira com flexões... Resumindo e concluindo, achei muito pouca piada, diria, deplorável.
Vamos lá ver, adoro o conceito das praxes, acho muito divertido, quase que como um evento para socializar, para facilitar os caloiros na procura de amizades, para que possam cantar, disputar com outras equipas, picar, beber todos juntos, mas levar tanto a sério a igualdade do traje? Quer dizer, rapazes que têm de fazer a barba, raparigas que não podem ter um gancho, unhas pintadas, que têm de usar tudo na perfeição ou vão a julgamento? Mas qual é a necessidade de levarem tão a sério uma hierarquia inventada por pessoas, que possivelmente se aproveitam do traje para dizerem que são alguém na vida quando sem o traje não passam de o mero comum. Pessoas que quando vestem o traje, vestem também a capa da falta de educação e da antipatia, o colete da omnipotência e cuja única coisa que sabem fazer é gritar aos ouvidos de miúdos, que muitas das vezes são tão fracos de cabeça que admitem coisas destas? Quer dizer, fazem queixa porque alguém não sabe usar o traje ou porque uma miúda fez 10 flexões e teve 10 segundos em prancha, mas não se queixam de quando lhes gritam aos ouvidos, quando os mandam calar, achando-se superiores? Se uma pessoa é como é, porquê mudar quando veste o traje? Isto deixa-me a pensar que este ritual é para aqueles que não têm personalidade serem superiores a alguém durante três ou cinco anos de vida, pessoas que sem a máscara não são nada e que com este tipo de atitudes sobrepõem aqueles que, como eu, em nada mudam só porque vestem uma traje que faz deles superiores numa hierarquia ilusória...
Antes deste triste episódio, tinha até pensado em trajar, acho bonito, gosto da equipa em que fiquei, tentam que todos se integrem, que todos se conheçam, mas a que custo? Para cumprir um código com o qual não me identifico, onde não há espaço para uma individualidade, para cumprir regras sem sentido nenhum no mundo moderno? Para fazer parte de uma comunidade que leva demasiado a sério um conceito inventado?
Até que ponto não me vou contradizer se vestir a pele daqueles que critico aqui?
terça-feira, 24 de março de 2015
Enquanto penso
Às vezes dou por mim a pensar que nem para pensar tenho liberdade. Que falta algo para me sentir completamente livre, uma opção, uma escolha. Que por vezes a minha vida toma um rumo que eu própria não acompanho, não percebo, algo que é como se estivesse fora de mim, que me deixa pensar que penso que escolho. Mas quando de facto, me é permitido acreditar que penso, e me ponho efectivamente a pensar, penso que mesmo que não tenha livre-arbítrio, aquilo que tem sido decidido para mim ao longo de vinte e um anos de vida, me deixa duvidar se sou livre ou não. Facto é que, pensando ou não, consigo acreditar que por vezes sou eu que tenho o leme, e mesmo não sabendo para onde vou, escolhi seguir a maré. Cheiro a liberdade, cheiro a maresia.
Se me é então permitido que pense, foi-me permitido viver debaixo de um tecto, com uma família, que por vezes me afunilou a liberdade, mas que cegamente me deu tudo. Foi-me permitido ter uma educação, socializar num ambiente sempre adequado, nunca me faltou comida, nunca me faltou dinheiro. Foi-me permitido usufruir dos meus direitos. E que direito tenho eu de não me sentir livre? E que direito tenho eu de reclamar?
Joana Cancelinha
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sexta-feira, 13 de junho de 2014
Project faces
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